domingo, 21 de março de 2010

Antigos jingles que marcaram época garantem sucesso de marcas

Sandra Kiefer - Estado de Minas
Publicação: 21/03/2010 07:55 Atualização: 21/03/2010 08:06

Andréia Fernandes, dentro da panela de alumínio, como no jingle da Loja Lua de mel, sucedeu o pai, fundador da empresa em 1973


Há casos de jingles tão memoráveis, que passados 15 a 30 anos depois de executados pela última vez no rádio, ainda são cantarolados como se fosse hoje por duas a três gerações de possíveis clientes. As boas músicas de comerciais tocam no coração dos potenciais compradores e também no bolso do empresário, ajudando a divulgar a marca e a aumentar as vendas. Quer ver? Que morador da capital mineira das décadas de 1970 e 80 não sabe dizer de cor o endereço da Belorizonte Couros? É preciso dizer que a empresa já quase não trabalha com "couros" no século 21 e multiplicou em quatro lojas a unidade mais antiga e rentável de todas, situada na Avenida Paraná, número 100.

A empresa surgiu em 1950 para suprir a demanda de sapateiros e de selarias, que fabricavam selas para atender os moradores da capital da época, movida a cavalos e bondes. Foi fundada por Miguel de Carvalho Pimentel, que morreu há dois anos, pai de Fernando Pimentel, ex-prefeito de BH. Articulado, o comerciante contratou uma agência de publicidade para gravar o jingle, na década de 1960. O feito iria marcar a mudança de endereço da loja, que funcionava originalmente na Avenida Paraná, número 357. "Alguns jingles dão tão certo que criam vida própria. O público se lembra do produto não porque um dia tomou Melhoral ou por que eventualmente comprou um cobertor de nome Parahyba, que não tenho visto no mercado, mas porque a propaganda estabeleceu um vínculo com o consumidor", observa o Mauro Calixta, especialista em marca.

O publicitário nem sonha que os cobertores Parahyba continuam na ativa. Aos 85 anos de idade, os cobertores podem ser encontrados na centenária Casas Pernambucanas, em 270 filiais espalhadas em sete estados brasileiros. Fundada em Pernambuco pelo sueco Herman Theodor Lundgren, chegou a ser a maior rede de lojas do país, em 1970. Em 1960, ficou famoso o filme de propaganda "Quem bate? É o frio. Não Adianta bater, eu não deixo você entrar". "Penso que o jingle pode ser ótimo, mas se o produto não estiver à altura, acaba desaparecendo com o tempo, assim como as músicas de sucesso", compara Luiz Antônio di Sessa, responsável pela área comercial dos Cobertores Parahyba.

Ocorre de o jingle ser capaz até de limitar a empresa, caso da própria Belorizonte Couros, de BH. "A letra curta, de fácil memorização, ajudou a marcar o endereço da nossa primeira loja, mas depois ficou pequena para nós. Já chegamos a ter sete lojas", explica o neto do fundador, Paulo Romano, sócio-diretor da empresa. Com apenas 5% das vendas em couros, a empresa se voltou para a instalação de pisos laminados, participando de licitações governamentais. Segundo Romano, o tema foi repetido durante anos nas rádios, sendo adaptado com o uso apenas do instrumental, em outras mantendo só o "belorizonte couros" e numa versão alternativa "belorizonte couros / qualidade pra você", com a mesma melodia.

"Não existe fórmula, mas algumas músicas grudam na cabeça. Às vezes, a gente assovia uma música sem nem saber a letra", ensina o músico e produtor musical Bob Tostes. O jingle pode até sobreviver à empresa, como o "Varig, Varig, Varig", que permaneceu inalterada na lembrança mesmo após a turbulência enfrentada pela companhia aérea, incorporada pela Gol em março de 2007. O tempo também passou para o Bamerindus, vendido ao HSBC, em 1997. Ao que parece, porém, os poupadores do banco continuam numa boa, assim como a música-chiclete utilizada no início da década de 1990.

"Os jingles não estão em um bom momento hoje. Eles não são memoráveis, não passam de uma música para acompanhar a imagem da televisão", diz o produtor musical Alexandre Martins, proprietário do estúdio REC, que musicou a trilha de Blindness (Ensaio sobre a cegueira), último filme do cineasta brasileiro Fernando Meirelles. Verdade seja dita, os antigos jingles eram feitos por compositores e poetas, como Olavo Bilac, autor de "Melhoral, Melhoral, é melhor e não faz mal".

Outra propaganda que pegou - "Levanta Maria, acorda Manoel, vamos comprar louças na Lua de Mel" - é assinada pelo cantor de músicas sertanejas Caxangá, sob encomenda de uma agência de publicidade da década de 1970. Ela é quem contratou a menina e o menino que, no anúncio, entravam dentro da panela de alumínio. Hoje, as crianças da primeira versão do comercial já são avós. "O sucesso do jingle coroou a dedicação e o profissionalismo do meu pai. O reconhecimento não é para mim, é para ele", afirma Andréia Fernandes de Almeida, filha de José Gomes Fernandes, que fundou a loja em 1973. Ela recebeu a loja com a morte do pai, em abril de 2004. O carro-chefe da Lua de Mel, que fornece utensílios domésticos para recém-casados, são ainda as panelas. No mesmo endereço e 10 funcionários, a empresa conserta em média 50 panelas de pressão por dia. Os consertos custam de R$ 10 a R$ 30 e uma panela industrial pode valer até R$ 600.

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