Artigo do Instituto
Teotônio Vilela (ITV)
Uma Comissão Parlamentar de Inquérito
criada sob o estímulo de Luiz Inácio Lula da Silva não tinha mesmo como acabar
bem. Mas o que aconteceu na CPI que deveria apurar as ligações do contraventor
Carlos Cachoeira com o submundo da política supera qualquer expectativa
negativa. O PT transformou a investigação num meio de vingança e, mais uma vez,
subverteu um instrumento legítimo de atuação do Congresso.
O relatório final da CPI, apresentado
pelo petista Odair Cunha, é um escárnio do começo ao fim. Indicia pessoas que
sequer foram ouvidas ao longo dos trabalhos da comissão, ignora políticos
aliados cujos laços com negócios espúrios são evidentes e passa ao largo de uma
investigação mais séria sobre os dutos que drenaram recursos públicos para
campanhas eleitorais de petistas e aliados por meio da empresa Delta.
O relator pede indiciamento de 46
pessoas, com destaque para cinco jornalistas, entre eles o diretor da
revista Veja em Brasília, e o governador de Goiás, Marconi
Perillo. Também recomenda que o Conselho Nacional do Ministério Público
investigue o procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Gente como os
governadores do Distrito Federal, o petista Agnelo Queiroz, e do Rio de
Janeiro, Sérgio Cabral, saíram incólumes.
O objetivo do relator com seu texto
resta evidente: transformar as conclusões da CPI numa revanche do partido dos
mensaleiros pela condenação impingida pelo Supremo Tribunal Federal ao maior
esquema de corrupção da história política do país. "Quem não pôde
desmontar 'a farsa do mensalão' tratou de montar a farsa de comissão",
sintetiza Dora Kramer n'O Estado de S.Paulo.
Todos os algozes do PT estão no texto de
mais de 5 mil páginas preparado pelo deputado mineiro: a imprensa
investigativa, o Ministério Público, políticos de partidos adversários. Não há
novidade: a regra do jogo petista é transformar instituições republicanas em
armas políticas - além, claro, de atrasar obras, como vimos nesta semana em
relação ao PAC...
Insuflada por Lula, a CPI da vingança
foi instalada em 25 de abril, quando o STF já havia marcado o julgamento do mensalão,
mas ainda não haviam começado as sessões que magnetizariam a atenção do país e
condenariam a passar anos na cadeia a cúpula do PT à época em que o partido
ascendeu à presidência da República.
Tratou-se, portanto, de uma tentativa de
rivalizar as atenções com o julgamento que, contudo, não funcionou como
Lula e seus mensaleiros esperavam. Restou aos desesperados e condenados
petistas, além de aliados seus com a estirpe de Fernando Collor de Mello, usar
o relatório de Cunha como arma política.
Mas o texto é tão descaradamente
desequilibrado e tão acintosamente manipulador que mereceu repúdio unânime da
opinião pública e foi alvo de críticas até de aliados do petismo no Congresso e
na sociedade civil, como a Fenaj. "A irrelevância já é um final lamentável
para a CPI, mas seu completo desvirtuamento será um desserviço ainda
maior", adverte a Folha de S.Paulo em editorial.
A mais evidente frente de investigação
que deveria ter sido trilhada pela CPI não o foi, por clara escolha do
relator e do PT: a apuração da relação entre a Delta Construções, uma penca de
empresas laranjas e o desvio de cerca de R$ 450 milhões de dinheiro público,
originado do Dnit e de órgãos de diferentes estados e movimentado pelo esquema
de Cachoeira para o bolso de políticos que orbitam em torno do petismo.
A CPI comandada pelos petistas
simplesmente deixou de investigar 117 empresas, muitas delas fantasmas, que
firmaram contratos suspeitos com a Delta, além de não identificar os
beneficiários do dinheiro que azeitava as engrenagens do poder na máquina
pública federal. O relator também deixou da abordar a revelação, feita em
agosto por Luiz Antonio Pagot, de que o Dnit foi usado para levantar dinheiro
para a campanha que elegeu Dilma Rousseff em 2010. Não espanta que, apesar de
considerada inidônea pelo TCU, a Delta mantenha-se como vice-campeã entre as
empresas contratadas para obras federais...
Mas tal manobra governista não passará
incólume, já que parlamentares da oposição e independentes deverão apresentar
ainda hoje relatório paralelo com conclusões consistentes resultantes das
investigações dos últimos sete meses. Ali poderá estar o caminho para se chegar
ao dinheiro surrupiado dos cofres públicos e rivalizar com o verdadeiro
tribunal de exceção que o PT instalou na CPI do Cachoeira.