segunda-feira, 8 de março de 2010

O dever dos outros

Quando Aécio retirou seu nome da disputa para ser o candidato tucano a presidente, não estava subentendido que permaneceria na chapa como vice. Aécio jamais pensou em ser candidato a vice e negou a possibilidade vezes sem conta.

Marcos Coimbra - Especial para o EM
Publicação: 07/03/2010 10:48 Atualização: 07/03/2010 10:55

A pressão que alguns setores da oposição fizeram, nos últimos dias, sobre Aécio Neves chegou a ser, em alguns momentos, engraçada. Tudo para que ele aceitasse, de preferência imediatamente, ser o vice de Serra nas eleições deste ano.

Começava aí o lado cômico, querer que alguém corresse para anunciar que seria o vice de quem ainda não dissera ser candidato. Até as pedras da rua sabem que não é assim que as coisas acontecem e que, para montar uma chapa, o primeiro passo é a "cabeça", como se diz no jargão da política. Chega a ser ridículo o inverso.

Não era engraçado, mas pouco compreensível, o argumento de que, mesmo sem que Serra tivesse assumido a candidatura, Aécio deveria se oferecer para secundá-lo. Nunca houve um compromisso desse tipo entre os dois e, quando Aécio retirou seu nome da disputa para ser o candidato tucano a presidente, não estava subentendido que permaneceria na chapa como vice. Aliás, o que sempre foi afirmado pelas lideranças dos partidos de oposição é que a vaga de vice seria para um nome de fora do PSDB, de maneira a reforçar a aliança entre eles.

Aécio jamais pensou em ser candidato a vice e negou a possibilidade vezes sem conta. Esqueçamos, por um momento, suas razões (que são boas). Digamos que era apenas seu desejo. Ou seja, que ele apenas preferia ser candidato a outra coisa, no caso, ao Senado. Que, não sendo candidato a presidente da República, não era de seu interesse participar da eleição nacional.
Na imensa maioria dos países, uma declaração como essa não causaria espanto. Salvo nos partidos altamente centralizados e com disciplina rígida (como as organizações extremistas militarizadas, de esquerda ou direita), os políticos costumam direcionar a carreira segundo suas próprias conveniências e preferências. Ninguém é obrigado a ser candidato a isso ou aquilo.

No Brasil, nem se fala. Aqui, os partidos não determinam "missões" a seus filiados, não os forçam a concorrer a cargos aos quais não aspiram.
Veja-se, por exemplo, o que está acontecendo agora, na eleição presidencial. Marina foi incumbida pelo PV a se candidatar? Teria sido Dilma constrangida a concorrer? Quando o PSOL quis que Heloísa Helena se candidatasse e ela não, o que aconteceu? Ciro está no páreo por determinação do PSB?

E Serra? Sua insistência em só assumir a candidatura quando quiser não está sendo respeitada por todos? Mesmo se a quase totalidade de seus companheiros não concorda com ele?

Não fazia sentido tamanha desproporção de pesos e medidas. Cobrava-se de Aécio algo que não existe em nossa vida política, a obrigação de se submeter a uma espécie de "dever partidário" (como se só houvesse uma interpretação do que é melhor para o PSDB!).

Enquanto isso, se aceita que o governador de São Paulo fique à vontade para fazer como quer, o que equivale a relevá-lo de deveres para com seus correligionários e aliados.

O curioso é que toda essa pressão veio quando as pesquisas confirmaram o que já se sabia fazia tempo, que Dilma iria crescer e Serra cair, à medida que aumentasse o conhecimento de ela ser a candidata de Lula, assim se tornando a opção de quem está satisfeito com o governo e quer sua continuidade. Não se pode falar em emergência, em fato novo, quando acontece o previsto. Se não montaram sua estratégia eleitoral (incluindo a escolha do candidato) levando isso em conta, as oposições erraram.

Quem sabe, finalmente, foi aceita a realidade: Serra é o candidato e Aécio não vai ser vice. A menos que tudo que foi combinado seja revisto. Agora, engraçado mesmo era achar que quem tinha que mudar era Aécio. Logo ele, que fez o que pôde para evitar que seu partido chegasse aonde está.

Marcos Coimbra é cientista político e sociólogo

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