Artigo do senador Aécio Neves para a Folha de
S.Paulo
A diplomacia brasileira já
viveu dias melhores. As circunstâncias que forçaram a fuga cinematográfica do
senador asilado Roger Molina, da embaixada em La Paz para o Brasil, derrubaram
o pouco que restava da imagem de profissionalismo da nossa chancelaria.
Longe de ser fato isolado, o
episódio se inscreve em um incrível rol de desacertos que se acumulam na gestão
da política externa, desde que a ela se impôs um nítido viés ideológico.
O Brasil não reagiu, por
exemplo, à expropriação das refinarias da Petrobras em Santa Cruz; colaborou
para afastar o Paraguai do Mercosul, abrindo as portas à Venezuela chavista;
apoiou com eloquência o governo iraniano e achincalhou o instituto do asilo, ao
deportar, em tempo recorde, dois boxeadores cubanos durante os Jogos
Pan-Americanos de 2007.
Agora, a contratação de
médicos estrangeiros tangencia a dimensão dos direitos humanos, ao impor,
apenas aos profissionais cubanos, uma condição de permanência no país que
afronta a Constituição.
O governismo tenta reduzir a
questão aos que seriam contra ou a favor de contratar mais médicos para a
população, evitando o debate em torno da falta de transparência da iniciativa,
que alimenta especulações graves: o país negará aos cubanos o tratamento que
oferece aos cidadãos de outros países? Poderão, se quiserem, casar e viver no
Brasil? Se pedirem asilo, serão deportados?
Ao enfraquecer o patrimônio
ético e moral do asilo, que já salvou a vida de centenas de brasileiros vítimas
de perseguição política, o país se apequena diante da comunidade internacional.
O esforço feito no passado
para reinserir o Brasil no mapa global, com atuação relevante em temas
importantes no âmbito multilateral, tem sido muito atingido. A verdade é que a
política externa deixou de representar os interesses permanentes do Estado
brasileiro para defender o ideário do governo de plantão.
Entre outros alinhamentos, o
Brasil deixou em posição secundária a cooperação com os países desenvolvidos
para priorizar as relações com nações emergentes e com os vizinhos no continente,
em especial os afinados ideologicamente.
Com isso, nossa fatia no
comércio internacional vem declinando e nos últimos anos firmamos apenas três
acordos comerciais, com países de pouca relevância. Esta política enviesada
alija nossas empresas das cadeias globais de produção e, dessa maneira, deixa
de gerar aqui empregos de melhor qualidade.
O declínio da credibilidade
do Itamaraty é um retrato lamentável de uma gestão submersa em questões
ideológicas. E de um governo que se supõe sinônimo de país, incapaz de perceber
a diferença entre a conveniência de um e os interesses maiores do outro.
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